Citações:

Sem o direito natural não há Estado de direito. Pois a submissão do Estado à ordem jurídica, com a garantia dos direitos humanos, só é verdadeiramente eficaz reconhecendo-se um critério objetivo de justiça, que transcende o direito positivo e do qual este depende. Ou a razão do direito e da justiça reside num princípio superior à votante dos legisladores e decorrente da própria natureza, ou a ordem jurídica é simplesmente expressão da força social dominante
(José Pedro Galvão de Sousa, brasileiro, 1912-1992)

sábado, 29 de junho de 2013

Distração, Alheamento, ...

Ainda não sei se lhe chamar «Distração» ou «Alheamento», mas como todos os livros terá de ter um título; arrasta-se vagarosamente a dois terços, mas lá chegará...
«Quando cheguei a casa despi a bata e tudo o que veio atrás e fui-me enfiar na banheira para me libertar, não só do cansaço, mas acima de tudo do morto. Em condições normais o meu alvo seria a cama tamanho médio dividida com a minha velha; embora àquela hora as pessoas normais estivessem nas suas lides normais laborais e não espetadas no vale dos lençóis: as que estavam, obviamente, porque muitas outras já não sabiam o que isso era há muito tempo; ter um emprego, com horário de início e fim era agora uma miragem para muitos e uma oportunidade na boca dos imbecis! E como neste mar de tubarões e de frágeis sardinhas, abundavam tantos chernes e pescadinhas de rabo na boca.» PAS

quinta-feira, 27 de junho de 2013

À DOriva

Navegas assim sozinha
Quando tens tantos capitães
E imediatos
para te ajudar a levantar 

o velame
da tua adriça.
Na tua dor 

até os teus sentidos adormeces.
Perdeste-te no quintal das coisas más
Onde o purpura se confunde com o rosa
E o rosa se desbota do branco

Não queres ajuda
Dos teus amigos,
Como se fundo do teu baú
Conseguisses desencantar
Um pedaço do teu orgulho
Rumando sempre de vela
Acessa

No caminho da tempestade
Em que te exauras.

PAS

Da «Preguiça» E da Escala da Medida Do Amor

«na frase de Bertolt Brecht: “Um homem tem sempre medo de uma mulher que o ame muito”.

«Sim, porque o amor é uma guerra. Uma guerra que as mulheres perdem por amar demais. E por amar homens que não as merecem. Ou homens que não merecem o excesso de amor, provavelmente porque o confundem com vitória. E para um homem, depois de uma vitória não vem paz. Vem sempre outra batalha e outra e outra, porque a paz é uma derrota e nenhum homem quer ficar refém.»

Muito curioso este conto que a Teresa aqui coloca. Muito curioso por asserções que como tudo na vida são meras regularidades sem comprovação à vista.
A primeira a de Brecht! De que homens falava Brecht? Como podia Brecht arrogar-se o direito de postular sobre o que se passa dentro de todo e cada homem?
A segunda, a do amor como uma guerra, que as mulheres perdem por amar demais! E por amar homens que não as merecem. Como se só as mulheres pudessem amar demais, ou os homens terem só mulheres que as merecem.
Pensou como os homens refractam as imagens, sejam de corpos triangulares, olhos de lince, ou cinturinhas finas e peitos firmes, suculentos. Como se os homens fossem por natureza predadores com presas sempre à vista e a vitória da conquista fosse um saciar de leão arrostando a presa a seus pés.
Puxou de um livro de notas, onde anotava as asserções que lhe tinham passado pela vista e pela vida.
Numa das notas, retirada de uma afirmação professoral, dizia: «a generalização é a arma dos ignorantes». Pensou um pouco. Sim, o contexto era diferente, mas podia adaptá-lo a os «homens são de marte, as mulheres de…». Sim, num contexto diferente.
«Mas não são as generalizações ignorância na totalidade das diferentes formas de amor? Estereótipos onde faltam homens e mulheres com outras formas exteriores e interiores? Ou excessos de imagens exteriores, valorizações deturpadas do belo e bonito?»
À sua frente um jovem casal brigava forte e feio. Ele, um daqueles garotos que cultivava o físico e metro sexualizava o corpo, sempre desejoso de um espelho que refletisse a sua imagem. Ela, uma rapariguinha excessivamente pintada e adornada, que seguia a moda da falsa construção da imagem e que acreditava que tinha encontrado o seu amor eterno naquele narciso de músculos temporários!

quarta-feira, 26 de junho de 2013

Reencarnação

«José é um dos meus autores preferidos a par com Eça e Cardoso Pires; não foi um «gosto» fácil, mas um encontro tardio e demorado. Um daqueles «gostos» marcado por uma certa idade, onde à quantidade, que soçobra, se persevera, sobrevivendo, a qualidade. Com a maturidade veio a certeza que o trabalho dá frutos - e como José foi um trabalhador da escrita! - e a certeza que a própria leitura deve ser saboreada analisando a contra luz as suas propriedades físicas e estabelecida a química da sua identidade.
Pelos «90 anos do nascimento de José», eu José, filho e neto de austeros Josés, já tinha guardadas cem páginas de homenagem a este Josué da escrita, que avançam à medida da reprodução celular e de alguma intenção epistolar.»

O Luís Osório

 O Luís (Osório), escreveu hoje este texto que cai como uma luva neste meu pequeno poema.
«Sempre que o vejo dou-lhe moedas. É um ritual: pergunta-me se tenho um cafezinho, respondo-lhe que sim. Deixou de me agradecer. Há tempo que não o faz, é coisa mecânica, melhor assim – bebe o seu café, fuma o seu cigarro e eu lavo um cantinho de alma. Em dia de milhões pedintes acantonam-se às portas do jogo, sobretudo se no menu estiver um jackpot. Esmolas dadas por quem pede uma esmola maior. A lei da retribuição, consequência da consequência, dá-se para se receber em dobro, um investimento. Oferece-se uma moeda em troca do prolongamento de um desejo, não é um mau negócio. Fazer o Bem sem nada em troca é um campo para eleitos, apenas para uns poucos… gente de asas invisíveis, já não são daqui. A maioria de nós, mesmo os bons, grita por atenção e por um olhar que comprove o quanto valemos a pena.» Luís Osório
Sempre fomos mais os outros que nós próprios! Quem se esquece disso nunca será a boa moeda que afasta também ela a má moeda. Tudo uma questão de trocos e de dar visibilidade às nossas asas de anjos. É que elas estão lá, mas precisam de um sopro de alma!


Já te esqueci.

Foste como uma primavera árabe
Um vento do deserto
Que assobiou
Bem a meu lado.

Já te esqueci.

E repousas agora
De páginas abertas
E de letras às avessas
No meu caderno diário
Como um dos meus
Mais difíceis 
Estudos de Caso.

Já te esqueci.

Como uma aurora esperada
Que não chegou a acontecer.

Já te esqueci.

Repousa lá agora
Intocada,
No interior das minhas letras.

E a minha contemplação,

É apenas um exercício diário
Repleto
Da compreensão
Das tuas faltas.

E, no entanto,
Podia ter sido 
De outro modo

Se não te enganasses
Sem pudor
A cada passo.

Se entreviesses
Que recebe
Só quem dá

Com essa dádiva
Do céu
De só sermos nós
Sendo os outros.

De outro modo,

Somos pássaros
Enganados
Saltando
Entre a ramagem

Tropeçando
Em galhos
Frágeis,

Que se partem
A cada chegada 

E a cada percurso

De um novo voo.
PAS

terça-feira, 25 de junho de 2013

Ficção Pobre, Ficção Rica!

Muito curiosa esta afirmação de pacatez como causa – efeito, de uma ficção pobre nacional. Curiosa porque vai contra uma certa visão editorial que privilegia o canto (e o conto) do eu, a história centrada no eu quase terapêutico em detrimento da riqueza dos actos e dos factos. A própria menorização da figura do conto é ela um paradoxo só compreensível na visão de um mundo a duas entradas, de duas partidas dobradas: o débito e o crédito.
Vivemos num mundo normalizado e banalizado. A nossa linguagem é cada vez menos diferenciada, cada vez mais apropriada. A própria condição autoral fenece cada vez mais neste pulsar coletivo, já não de uma escrita muitas vezes reflexiva, mas de uma reescrita de pedaços, como hienas, chacais e aves carnívoras que abocanham por um momento de pretensa glória. Algo que angustia (passageiramente é certo) quem ainda escreve, não como um industrial de fatos, mas como cerzideira com atenção a cada ponto, de dedal na mão e não sem aquela «pasta» que adultera a verdadeira criação.    
Muitos vivem hoje numa espécie de espaços lagunares onde os predadores e outros peixes mais diversos e coloridos não entram, sem nunca experimentar as águas adjacentes com mais nutrientes - mais revoltas e inseguras, é certo.
O português não é mais nem menos pacato que o espanhol; nem mais ou menos alienado do mundo; nem mais, nem menos mundividente ou cerceado de imaginação.
E basta estar atento a algumas movimentações no palco social, para percebermos como a vida também pulsa no rectângulo, cheia de diatribes, loucuras e outros castelos de cartas sempre prontos a desabar… e a romancear.
O que talvez tenha de mudar é o palco. Mas o palco, para nós, sempre esteve para lá da linha do horizonte.
(Pobreza ficcional, espanhol! Pudesses fazer como eu, que escrevendo já com uma coisa a que chamaram de AO, o pude fazer hoje com o anterior só porque… porque me apeteceu! Vê lá se também o podes fazer, se tens esta riqueza, ó espanhol?)    

segunda-feira, 24 de junho de 2013

Tango Poético

Este entrevista do Afonso Ramos é muito interessante  porque revela um dos objetivos mais queridos de qualquer poeta: encontrar uma «companheira de poesia» com quem poder dançar «o Tango».
«Sim. Até porque faz duetos poéticos com uma amiga também poeta. É um amor mentiroso?
Não é mentiroso. É verdadeiro dentro daquele contexto. A escrita tem esse fascínio. Dá-nos liberdade de criar. Eu na escrita posso ser tudo o que eu quiser. O dueto é possível desde o momento em que as duas pessoas que estão a escrever entendam isso e estejam na mesma linha. Isto é como dançar. Precisamos de um par. Se o par for bom dançamos melhor. É claro que é necessária grande afinidade e cumplicidade.»

sexta-feira, 21 de junho de 2013

Ver, Ouvir E Contar

Um dia perguntaram-me? Porque é que te expressas tão pouco pela boca?, como se dissessem: porque és tão calado, embora bom observador?
Não pude deixar de responder, mas numa folha de papel: Porque as minhas palavras passam primeiro pela ponta dos meus dedos!

A Menina Dos 800$000 Réis

Que crime, que vilania, que incrível estrebuchar de dentes. Estava eu a ler o Ortigão e os seus conselhos a um jovem poeta «poça, lá porque passei temporalmente dos 40, não deixo de ser jovem…ou não?» que dizia que «Em Portugal há honestos empregados públicos, probos negociantes, pacíficos chefes de família, discretos bebedores de chá com leite e do palhete Colares destemperado com água do Arsenal, que seguiram o género de Baudelaire …» quando senão, «Como porém Baudelaire era corrupto e eles não são corruptos, como Baudelaire era um dândi e eles não são dândis, como Baudelaire viveu no boulevard dos italianos e eles vivem na rua dos Bacalhoeiros…», e mesmo, quando senão, a página se virou e lá fui parar à massa de matar ratos: «Ó Lemos! Ó afamado livreiro! Como tu és especial… O teu estabelecimento comercial não é simplesmente uma loja; é um método, é um sistema…»
Ah, ok! Isto compreendemos nós! O sistema!
Mas continua o amigo Ramalho: «Mas não! agora reparamos que possuis também a massa de matar ratos!»
OK! Agora já nos situamos. E termina o compincha Ramalho: «Logo que a pátria te pague esse tributo de gratidão e respeito, avisa, que queremos ir aí pelo primeiro paquete, antes de tudo para te adorar, e em seguida para travarmos relações com o “lindo romance” Teresinha ou a menina dos 800$000 réis.»

quinta-feira, 20 de junho de 2013

A Arte Da...

Estava para aqui a enviar um texto «acordado-ortografado» quando repentinamente me apercebeu, eu, um apóstata do AO já convertido, estar a interromper o início da minha página 107 do meu novo livro com um de cinco títulos possíveis para já - chame-se-lhe «A arte da...». E para confirmar que este AO até pode ser quase benigno, introduzi-o para confirmação, só como tira - teimas, já que desconfiava da resposta, num conversor:

A “Velha” fora levada quase às costas pela irmã e sobrinhos a um passeio pelas faldas do Douro. Andava preocupada comigo e não se queria afastar, mais a mais encerrada num vagão barca, rodeada de água por todos os lados e com serviço cinco estrelas: de um rio lindo, mas a que faltava a emoção dos rápidos e das cataratas.
Como habitualmente, naquele hábito que gera costume, a velha já se aparte de mim sem uma despedida, vida de médico sempre em prontidão, vida de médico feita na solidão dos doentes e dos necessitados de um afago. E a mulher? Pois, já sabia que assim iria ser: «Vida de médico!»
A história de Paulo, o morto, está cada vez mais confusa na minha cabeça. Esse absoluto que nos devora, não parece querer fazer tréguas comigo.
Procuro em vão o “Livro” pela secretária. Nada! Aborreço-me, como sempre, com esta mania absurda por parte da Irene, a empregada, de querer colocar todas as coisas no lugar como se a ordem das coisas pudesse ser resolvida encostando lombadas com lombadas, capas com capas – «Sim! O estado de esgotamento da minha livralhada, já obriga a estacionamento em segunda e terceira fila: Maldito tráfego!»
PAS
E, ops, antes e depois do AO, o texto está… igual!

Extracto do Poema A Casa Saramago

...
“Olha, Pilar,
Brilhante e amada consorte.
Olha e ouve,
O som do elefante,
Que ribomba
A cada nova passada,
Levado por uma forte levada
Que passa por ti,
A jusante.
... 
PAS

Prática E Persistência: Os Dois «Pês» Da Escrita

Rob Young tem hoje um artigo interessante sobre as sete virtudes cardinais virtuais dos escritores de sucesso, que reproduzo pouco à letra:
1) Diligência para a escrita regular: muitas más páginas antes de se escrever alguma coisa decente.
2) O amor pelo falhanço: parece algo masoquista, mas criatividade é experimentação; o falhanço não como o oposto do sucesso, mas a sua porta de entrada.
3)Purificar a desilusão: acredita que és fantástico e importante, mesmo que o não sejas.
4) Humildade para deixar o teu ego à porta: cuidar mais da história do que do ego: capacidade para aceitar feed - backs, crítica,...
5)Coragem face à constante rejeição: a escrita é tanto um ato público como pessoal; uma forma de exibicionismo...
6) Paciência para continuar apesar da rejeição: falharás, serás rejeitado; repete; torna-te melhor por pequenos incrementos; dá alguns anos e pode ser que chegues à mediocridade; dá algumas décadas e pode ser que te tornes bom. A escrita não é um estilo de vida para aqueles a quem falta "endurance". A paciência é obrigatória!
7) Autocontrole para seguir em frente: aprender a seguir em frente fazem a diferença entre  finalizar os objectivos e uma vida de fins perdidos! 

Prática e persistência, melhoram a tua capacidade pessoal, os teus resultados médios e as tuas capacidades como escritor.

terça-feira, 18 de junho de 2013

Amor Sem Idade: Saramago e Pilar

Que o amor não tem idade, já nós sabíamos! 
Que o amor somos nós no outro, também já sabíamos! 
Que o amor de Pilar e Saramago é um amor que inspira, idem! 
Mas que o amor destes dois, estava inscrito num mural da nossa cidade, isso ainda não sabíamos! 
Mas ficámos a saber, que mesmo na parede mais frágil o amor pode estar inscrito!

A Raridade Dá Voz Ao Perfume


Os Efeitos Subjetividade: O Efeito De Halo, Estereopatia...

Quando nos cruzamos com alguém somos inevitavelmente sujeitos a avaliação. 
Avaliação quase sempre penetrada daquilo que se designa de subjetividade. 
Uma sujetividade que pode ocasionada por um conhecimento de informação prévia, influenciando o juízo, ideia ou opinião; ou o denominado "efeito de halo", uma avaliação produzida pela aparência física externa, como se a  antipatia, o raciocínio ou a preguiça tivessem uma imagem.
Para além destes dois anteriores ainda poderíamos falar de um efeito da estereopatia, ou seja uma espécie de imutabilidade de quem avalia, processo normal e inconsciente - como se a bibliotecária fosse uma senhora idosa, óculos na ponta do nariz, cabelo apanhado desprovido de sensualidade.
E isto para não falar no efeito de contraste, efeito âncora e a própria infidelidade própria dependente do nosso estado físico, mental...
Através destes «efeitos subjetividade» nos apercebemos de como a grande maioria das vezes não devíamos ser lestos na avaliação por quem se nos depara no dia a dia das nossas vidas: para evitar que estes Estereótipos, Halos e outros efeitos nos dêem imagens enganosas à nossa retina.    

segunda-feira, 17 de junho de 2013

O Absoluto Que Nos Devora

«Um dos meus sete pecados mortais: a sede de amor absoluto que me devora.
Miguel Torga»
Esse pecado para mim não é mortal, mas dos que mata. Mata a nossa alegria, a nossa consciência do erro, faz desses absolutistas do tudo ou nada, carrascos de si próprios.
Para mal dos pecados e sofrimento atroz dos poetas e escritores, há essa espécie de absoluto, de superlativo que os devora: esse amor que não é por um ser em especial, mas pelas «coisas» que gravitam à nossa volta. 
Como se a paz não repousasse nas coisas simples e não pudessem os poetas, os criadores, usufruir desse tempo de olhos descansados.
Este frase do grande escritor e poeta Torga é bonita na sua dureza, ou não fosse o Torga um homem granítico e encerra um forte conteúdo terapêutico e pedagógico. 
 

Amanhe Ser II

Se ouvisses aqui
O assobio do mocho  
Desfiando as tuas palavras
E sorvendo-as
Sofregamente
Saberias
Que as sombras que tens
Impressas no teu olhar
Tomam forma 
Pouco a pouco
No horizonte.

E que a luz que irradias
Não é apenas 
Reflexo do voo
De borboletas
Mas de uma
Grande mariposa
Que ao longe abana
Freneticamente
Ao ritmo da primavera
As grandes asas

Fugindo à linha 
Fria do horizonte
À procura de um regaço
Quente e meigo
Onde poisar. 
 ©PAS

Prefácio do Meu Primeiro Livro Que Sairá Breve, Quanto A Brevidade O Permitir



«PREFÁCIO.

Sou corrupto mas ninguém me vê vi
 (Tradução Da citação Do livro Dos Animais:
«Sou corrupto mas ninguém me via»;
Autor Incógnito)

No nonsense que nos atordoa os dias, M. teve que se socorrer de todos os seus recursos para impedir uma tragédia de dimensões épicas, evitando que Lisboa se tornasse na cidade dos mártires, ao nível de um 9/11. Utilizou todos os utensílios modernos e, porque mais vale estar mal acompanhado do que só, enviou um SOS pelo canal do LivroDasFronhas, outro pelo TeleCelular, outro ainda pelo TwistTer e por fim um anúncio nas páginas do ÓExpresso. E até publicou no DiárioDoQueResTaDaPiolheiraPública, não voluntariamente, mas por obrigação governamental. Que a esta altura no liberal retângulo, já ninguém se assoava sem um dicionário enciclopédico de leis, decretos - leis, portarias, decretos regulamentares, leis - quadro, leis – ordinária,
          “Se eram ordinárias porque é que se deixavam sair”, pensava A. como se as leis e quejandos tivessem vida própria e para quem as leis “tinham de ter a classe de um cavalheiro”: leis extraordinárias, diretivas, regulamentos, decisões, pareceres, recomendações e regulações que se agarravam às calças e casacos como pelo de cão, espinha de regulador, cuspo de redator, nódoa de comendador, borboto e baba de DonoDaPolis. E que se enfiavam, sem darmos por isso, Nos Bolsos Dos Casacos Dos Homens, Nas Carteiras De Pele Ligeiramente Maceradas Dos Precários, Nas Bolsinhas Das Malinhas De Senhora, Nas Grávidas A Quem Era Negado A Maternidade, No Meio Dos Dentes Cariados Da Classe Média, No Custe O Que Custar Que Ouvia Austin Em Sonhos Tornados Pesadelos E Ao Som De Marchas Patrióticas Partidárias De Antigas Juventudes Imaturas E QuePodiamCustar Guerras Civis Familiares, Violência Indomesticada, Crianças Mal Nutridas, Competência Inativa, Corpos A Flutuar Esvaziados Das Pontes, Corpos Esmigalhados Nas Vias, Corpos Distorcidos Por Envenenamento, Corpos Esmagados Em Dias De Cinquenta Por Cento De Rebajas, Consumidores Guerrilheiros a quem era apenas permitido ranger as esqueléticas na arena dos grandes mercados, tudo isto depois de, definitivamente enterrado o SimpleSex e Enterrado o ContratoDoEstadoLigeiramenteSocial, um emergir de uma apologética do liberalismo só nos dentes, como dizia o Nunes Deram Lhe Asas Para Voar - e que voou enquanto Não Aterrou E Enterrou Os Totós Dos Empreendedores. Desta vez tudo por obrigação, ViaCtt. Ao Nunes Deram Lhe Asas Para Voar como ao Fernão Capelo Gaivota. E como ela Foram Livres Foram Livres Para Voar… até Um Dia…

Mas, mas contemos a «estória» toda desde o início.»

PAS