Citações:

Sem o direito natural não há Estado de direito. Pois a submissão do Estado à ordem jurídica, com a garantia dos direitos humanos, só é verdadeiramente eficaz reconhecendo-se um critério objetivo de justiça, que transcende o direito positivo e do qual este depende. Ou a razão do direito e da justiça reside num princípio superior à votante dos legisladores e decorrente da própria natureza, ou a ordem jurídica é simplesmente expressão da força social dominante
(José Pedro Galvão de Sousa, brasileiro, 1912-1992)

quinta-feira, 28 de fevereiro de 2013

Universidade A Quanto Obrigas: Inepciocracia

Ontem estive a ser voluntariamente sujeito de audição de uma comissão de avaliação do ensino - superior.
Como quase sempre em Portugal, a audição decorreu sob a fórmula de uma prática formatada na sua abordagem e um formalismo de «antigo regime» - neste caso, apenas, de regime pedagógico vigente – não inteiramente amigo da «produtividade» das conclusões, que permitam implementar as melhores práticas dos sectores.
Uma audição colectiva que juntou 5 elementos da comissão nomeada pelo Ministério do ensino superior, provindos de universidades diferentes - do ISEG à Universidade Nova, da Universidade de Évora a uma Universidade Inglesa e outra de que não fixei os nomes, a cinco elementos finalistas discentes de MBA em modo presencial, mais 5 a distância via teleconferência.
A Universidade em questão, a UAb, é uma das Universidades de vanguarda deste país, pela modalidade na forma de relacionamento entre os seus actores, ou «shareholders», no sentido da partilha e na capacidade que este tipo de ensino demonstra de integração dos diferentes actores, mais próxima da realidade do que é hoje a gestão do conhecimento.
Universidade muito «utilizada» por quem, já tendo experiências de formação anterior, pretende não necessariamente enriquecer o curriculum ou propiciar-se um título académico como forma de «se alavancar», mas pretende realmente enriquecer-se através dos currículos e do conhecimento.
Como quase sempre em portugal, a comissão parecia já trazer um guião de «uma tragédia» previamente encomendada: a tragédia de um país que deixou de crescer querendo ajustar-se através da mediocridade do status atual, como se o amanhã só renascesse depois de todas as práticas já existentes serem «passadas a ferro grosseiro», sem qualquer tipo de «olhar» mais fino que «salvasse» as boas práticas, separando o trigo do joio.
Uma tragédia alicerçada na falta de financiamento público, com o risco inerente de reversão de um modelo que tão bons resultados tem trazido a um país, formativamente com um «gap» passado tão pronunciado de competências.
Um país onde as propinas são já tão elevadas e impraticáveis face aos rendimentos das famílias - pese embora comparações sempre possíveis com países onde as mesmas são elevadíssimas, e totalmente impossíveis de pagar pela grande maioria da população, esquecendo países onde o futuro constrói-se na sua quase inexistência (algo, elevação das propinas, que indiciaria um retrocesso não só do regime democrático, como resultaria na destruição desta tentativa da sociedade portuguesa de apanhar o comboio das competências, num mundo cada vez mais faseado, baseado e diferenciado no conhecimento.)    
As questões colocadas pela presidência da comissão focaram-se em duas ou três questões sobrelevadas pela resposta unânime perceptiva dos envolvidos (experiência consensualmente considerada como única, impossível de obter por outra forma e uma mais valia, muito para além de qualquer experiência de modalidade exclusivamente presencial, para todos os elementos sem exceção), mais em questões de não perceção do que em questões de perceção - «A ênfase no porquê de um número razoável de mestrandos terminarem as suas pós graduações e não avançarem para a defesa da tese?»
Uma resposta na altura não dada, que o modelo «pela rama» de audição – no sentido do tempo inflexível e curto para uma reflexão verdadeiramente clarificadora das experiências dos seus intervenientes, não permitiu.
A nossa resposta seria, pela perceção que é de todos – até dada por um pequeno estudo comparativo sobre diferentes tipos de modalidades de ensino que tive (mos) oportunidade de efectuar em seminário de projeto. E a resposta seria: «Porque o objetivo dos alunos desta universidade, pela sua tipologia - quase todos já inseridos no mercado de trabalho - visa essencialmente o enriquecimento concreto pelo conhecimento, mais do que a capacitação formal aos olhos societários: "o ser, o aprender, apreendendo, muito mais do que o parecer, ou o querer ser"»
Neste aspeto é curioso a similitude entre este tipo de audição presencial e os regimes presencial e de e-learnig a distância, debate coletivo pós-audição, quase como uma espécie de extensão nas duas horas seguintes dos debates in classe virtual, informalmente, com troca de experiências diversas, pós 50 minutos de audição.
No primeiro, as participações resumem-se e dividem-se por um espaço temporal diminuto, incapaz de agregar todas as participações, de acrescentar dúvidas, réplicas e de tirar conclusões – o tempo, o formalismo e as idiossincrassias são muitas vezes um inimigo da verdadeira abertura.
Por outro lado, no tipo de ensino sujeito a audição, porque objecto desta universidade, as matérias são dissecadas coletivamente com a participação de todos; para além desses espaços físicos se alargarem à reflexão democrática e coletiva, com total abertura e democraticamente, «just in time», de conteúdos actualizados e validados pela vida (o tal centramento na vida real) não dependentes de manuais pontos de chegada, mas exclusivamente pontos de partida, arregimentando pontos de vista, convergindo no melhor do que deve ter o ensino superior (a flexibilidade e a participação, tão pouco do agrado de um sociedade política fechada, enquistada e de «nobreza de corte»); não um ensino expositivo, amordaçado, unívoco (para que serve um ensino expositivo e de manual, num mundo a manuais actualizados just in time?), mas um ensino participado, cumulativo, biunívoco, embora encaminhado; dirigido pela perceção do mais relevante, traçado pelas orientações docentes, de orientação de rota, colectivamente re - refletido, de tempo alargado, não capturado.
O pior que o desconhecimento pode, é fazer involuir e reverter, tornando cada vez mais Portugal uma sociedade decadente, de falta de mérito e de falta de capacidade empreendedora, atrasado e de «antigo regime.»
É que a capacidade de empreendedorismo, a tal ligação à prática de que hoje se fala, só pode existir numa faculdade do futuro, em rede, passando pela liberdade, flexibilidade do espírito reflexivo e constante tomada de perspetiva filosófica: a todo o momento tenho de me actualizar e avaliar, porque o que eu sei em definitivo é que «sei que nada sei!»  

Sem comentários:

Enviar um comentário